Débora vive em uma das regiões mais pobres do Brasil: o Vale do Jequitinhonha, no norte de Minas Gerais. A jovem não mora longe da BR-116 e consegue chegar até a rodovia a pé.
Hoje aos 18 anos, ela perde a conta de quantas vezes fez este trajeto. Uma caminhada realizada na maior parte das vezes durante a noite, no escuro, e que invariavelmente terminava em exploração sexual .
O maior incentivador para que Debora seguisse esse caminho foi o próprio pai. “Era uma criança de 10 anos de idade sem saber o que era relação sexual, aí me envolvi nessa vida por causa dele”, conta.
O pai não se importou que Débora tivesse a iniciação sexual aos 10 anos de idade, com um sócio. O homem trabalhava em um garimpo e o colega se aproximava da menina quando estava na casa da família.
“O sócio do meu pai vinha, eu tava lá dentro vendo televisão, às vezes ele passava a mão na minha perna”, relembra.
Um dia, o homem ofereceu dinheiro para que ela comprasse material escolar. Em troca, estuprou Débora. “Praticamente nem sabia o que era aquilo, relação sexual. Depois que eu fui pesquisar muito na internet o que era prostituição, o que era ser virgem, como a pessoa sente quando perde a virgindade”, diz ela.
Este primeiro abuso mudou a vida da menina. E alterou a relação entre pai e filha para sempre. Debora passou a oferecer relações sexuais para homens.
Um dia, ela quis revelar o que fazia ao pai, que foi indiferente. “Ele só ficava me pedindo dinheiro. ́Débora,você tem 50 reais aí? Vai se prostituir, cadê seus contatos?’”, lembra ela.
Os “contatos” a que o pai se referia eram homens que conseguiam o número de Débora e marcavam encontros com ela, geralmente por mensagens de texto. Eles não se importavam em ter relações sexuais com uma menor e até perguntavam a idade dela. “Eu me sentia nojenta naquela hora. Tinha nojo do meu corpo, me sentia nojenta”, confessa.
Hoje, segundo Débora, muitos destes homens respondem na justiça pela exploração sexual que cometeram.
Há pouco tempo, amparada por uma ONG, ela deixou a prostituição. Só que o maior incentivador para que ela continue está bem próximo. E continua com as cobranças.
“Quando o meu pai me pede dinheiro e eu falo que eu não tenho, às vezes ele fala ‘rapariga, fica pra cima e pra baixo com qualquer um, agora fica aí falando que não tem dinheiro’. Ele até já quis levantar a mão pra mim, me chamando de rapariga, prostituta”, revela magoada.
Não é só o pai que a ofende. Na cidade, é chamada de ‘rapariga’. A última vez, quando foi pedir um emprego, ouviu da dona da loja que não era bem-vinda ali por conta do seu passado.
Débora tenta se libertar da memória dos dias de exploração, mas ainda se pega presa a este período na figura do pai. Ela reencontra a si mesma, no papel de menina abusada, sempre que o vê.
“Às vezes, eu olho e sinto nojo dele.”